domingo, 24 de abril de 2011

C O R P O ......

Corpo??? palavra estranha... soa-me mal aos ouvidos... não tem sonoridade.... o som é fechado... pesado... como afinal está o meu c o r p o !!!
Fiz bem em ir???? fiz mal???? não sei!!!!...
Só sei que vim extremamente cansada... e pergunto-me: "Será que já não posso viajar?!... viver o meu sonho de conhecer outras terras?! conhecer partes deste mundo que tanta curiosidade me trazem?"
Depois digo-me:" - Não, eu não posso fazer a vontade a este corpo.... este corpo que me tem feito tantas partidas!!! Este corpo que não é o meu! o corpo que eu sempre tive e que eu conhecia bem, era um corpo airoso, ligeiro e pronto a partir para qualquer aventura... !!
Mas, tens que te convencer que o teu corpo agora é este!.... um corpo pesado, desajeitado, coxo e cansado! e quero conviver com essa ideia . Cristalizá-la no meu cérebro!!". Então, estico as costas para me sentir melhor, com o corpo leve...leve como o de uma pessoa saudável... Recuso-me a ter este corpo... eu quero aquele que tinha há 10 anos, antes do acidente. Não era feliz porque me faltava a Marta, sentia um vazio terrível, o mundo às minhas costas... mas apesar disso tudo, esse corpo respondia aos meus desejos... eu podia ir onde quisesse.... , mas isso era dantes!!! agora o teu corpo é este e tens que te conformar!!!- diz-me o meu cérebro!!!...
Dóem-me as costas, o pé está inchadíssimo, a bengala é um estorvo e eu não me reconheço no espelho que me reflecte. Assusto-me... aquela figura do outro lado do espelho não posso ser eu!!!??? sinto-me estremecer de medo... medo por perceber que não sei nem reconhço que aquele é agora o meu corpo.
O elevador tem espelhos do lado esquerdo e do lado direito, espelhos enormes como é enorme o elevador... eu entro... e o que vejo reflectido não me agrada  ver... depois olho de novo e vejo a minha figura pesada, feia e distorcida reflectida vezes e vezes sem conta!!! olho-me e digo: "Mas não!!!... este corpo não é o meu!!!" E fico triste, fico revoltada com o individuo que provocou o acidente e me deixou assim... e não sei o que fazer... porque aquele corpo não corresponde à minha cabeça...
Sentia-me muito cansada... olhava os outros e adivinhava-lhes o pensamento:" quiseste vir, agora tens que te aguentar!! sabemos que estás a fazer um enorme esforço, mas temos que ir para a frente... "desculpa..." mas o avião não espera... o autocarro não espera... o jantar é à hora marcada... e o olhar complacente dos que me rodeavam fazia sentir-me mesmo, mas mesmo muito cansada, muito estoirada... muito desesperada.... e um pouco culpada...
"Mais um passo... força... qual corredor da maratona ( que irónica e curiosamente se corria nesse dia pelas ruas de Londres!!")  eu projectava o corpo para a frente, o rabo para trás e apoiando-me na bengala eu caminhava só por entre a multidão, só pelos corredores de acesso à pista do aeroporto e apenas dizia: "Força... força... a meta é já ali!!!..." e os corredores de cimento eram kilómetros e kilómetros de corredores para percorrer... sem fim... sem fim... kilómetros  que o  corredor da maratona de Londres, que nessa manhã ficou em último lugar... faria sem qualquer esforço...